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Uva de vinho de garrafão ou não? Você sabe a diferença? / Do you the distinction between indigenous and wine grapes?

Se você é brasileiro e gosta de vinho, deve ter ouvido que existem Vitis Viníferas, ou seja, uvas próprias para se fazer vinho e Vitis Americanas, uvas impróprias para fazer vinho e que quando produzem vinhos, eles são muito criticados e chamados de vinhos “suaves”, “de mesa” ou “de garrafão”. A alegação é que estas são uvas de mesa, ou seja, uvas que servem apenas para serem consumidas ao natural e não para vinificação. Mas, por que?

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O vinho produzido nos países de qualquer das Américas podem ter sido elaborados com uvas viníferas ou com uvas americanas que possuem este nome justamente porque não existem , naturalmente, no continente Europeu. Porém, a maior parte dos vinhos produzidos em todo o continente provém das vinhas européias, as Vitis Viníferas. A origem das V. Viníferas têm suas raízes no antigo Cáucaso (hoje a região onde ficam a Geórgia, Armênia, Azerbaijão) – acredite, por lá já se fazia vinho há 7.000 anos mais ou menos – e incluem os vinhos mais populares do mundo: Cabernet Sauvignon, Pinot Noir, Chardonnay, etc. Se quiser saber mais sobre este tema leia: Georgia, o berço do vinho.

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As uvas viníferas têm sido estudadas extensivamente. Elas são o que se pode chamar de elegantes e malvadas, pense O Diabo Veste Prada. Estas uvas são menores, têm sementes duras, suas peles são grossas e também oferecem maior conteúdo de suco vs. polpa. Além disso, elas são sensíveis, difíceis de transportar e quando você morde uma uva vinífera, ela se dissolve, deixando sementes amargas, resistentes e uma casca “chicletosa” na boca. Antipáticas…

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Uma doçura de Touriga Nacional.

O segredo delas é o seu alto teor de açúcar que deixa mãos e dedos pegajosos ao toque. As uvas viníferas, portanto, fazem vinhos melhores e se conservam muito mais tempo após a colheita. Assim, elas também têm uma maior variedade de sabores, que são mais delicados, mais ricos, com um aroma mais agradável, raramente ácido e nunca exalam o peculiar odor desagradável, rançoso e parecido com o aroma de cachorro molhado de muitas variedades americanas . O açúcar, ao fermentar, produz álcool e muitos compostos responsáveis pelos deliciosos aromas do vinho. Para sabe mais sobre aromas, você pode ler nossos artigos Que o álcool afeta muita coisa você já sabia, mas sabe como ele altera o sabor da sua bebida? e também Por que vinho tem aroma de abacaxi, canela ou madeira?

Os vinhos e seus deliciosos aromas.

A pouca utilização das Vitis Americanas na vinificação não se deve à falta de matéria-prima, pois todo o continente americano sempre esteve coberto de videiras. Tanto que em 985, um viking chamado Bjarni Herjolfsson avistou a América, depois que seu navio foi desviado do curso no caminho da Islândia para a Groenlândia. E em 1001, Leif Ericsson, o filho de Eric, o Vermelho, navegou para o oeste para encontrar esta nova terra. Leif e seus homens foram os primeiros europeus conhecidos a ter desembarcado na América. Eles passaram o inverno em um lugar que eles chamaram de “Vinland” (Wineland), justamente pela abundância de videiras no local.

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Os rolezinhos dos Vikings.

A compreensão das uvas de vinho nativas da América não é lá essas coisas. Elas são muito diferentes das viníferas em termos de como e onde crescem, que compostos aromáticos produzem e das técnicas de vinificação especiais devem ser praticadas a fim de que produzam vinhos mais complexos. Infelizmente, por razões comerciais, há pouco incentivo para estudá-las. Das centenas de variedades nativas que foram identificadas nos últimos 200 anos, pouquíssimas estão em cultivo.

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Diversidade de belas e suculentas uvas de mesa.

O que se sabe é que as uvas de mesa são mais bonitas e suculentas, pois são cultivadas de forma a tornarem-se mais desejáveis para o consumo ao natural. As mais modernas não têm nem sementes, têm polpa mais espessa e pele mais fina para fazer aquele delicioso ‘pop’ quando você as saboreia. Aliás, as uvas sem sementes são obviamente mais fáceis de comer, mas saiba que são menos saborosas do que as antigas variedades de uvas de mesa, semeadas.

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Um vistoso cacho de uva Niágara.

Alguns consumidores de vinho de mesa se queixam de uma adstringência desagradável em alguns vinhos de Vitis Viníferas, especialmente nos monovarietais e de que outros não têm caráter de sabor definido.  As uvas americanas, por outro lado, são mais refrescantes e o seu suco não fermentado faz uma bebida deliciosa, carregada de propriedades benéficas à saúde (resvetrarol) sem o prejuízo do álcool.

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Os benefícios do vinho tinto estão igualmente presentes no suco de uva.

Sabe-se também que as uvas de mesa têm menos acidez e menos açúcar do que as uvas viníferas. As uvas de mesa padrão têm um nível Brix de 17-19, enquanto as uvas viníferas têm um nível mais perto de 24-26 Brix na colheita. Brix é a escala utilizada para medir a porcentagem de açúcar em um líquido, algo muito importante no processo de fermentação do suco de uva para vinho.

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Refratrômetro medindo nível de açúcar.

A poda das videiras de mesa e das viníferas é igualmente importante, pois menos uvas equivale a sabores mais concentrados, ou seja, é igual a melhor vinho. Uma videira excessivamente vigorosa vai produzir um montão de uvas de qualidade fraca. Uma videira de menor vigor produzirá menos uvas muito mais concentradas. Uma única  videira de uvas de mesa como a Cowart Muscadine (Vitis rotundifolia) pode produzir 7 -14 kg. Uma Zinfandel (Vitis vinifera) produz cerca de 4-6 kg de uvas por videira. Taí a razão porque o vinho de uva de mesa é bem mais barato.

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Vitis vinífera bem podadinha para concentrar aromas e sabores.

Os agrônomos tentam unir por hibridização o lado bom da Vitis Vinífera com melhor das Vitis Americanas, buscando variedades fortes, saborosas e aromáticas como por exemplo a Goethe, mencionada em Aposto que desta uva você nunca ouviu falar. No entanto, apesar dos esforços dos produtores, poucos destes híbridos têm valor comercial. Como a gente já viu, a natureza, até agora tem feito um trabalho melhor. Mas isto todo mundo sabe, né?

Fonte: The Domestication of American Grapes  by Professor U. P. HEDRICK e Table Grapes x Wine Grape


If you are Brazilian and you enjoy wine, you must have heard that there is a Vitis vinifera (wine grape), grapes suitable for making wine and a Vitis Americana (indigenous grapes), grapes unfit for winemaking.

Wines produced with indigenous grapes are much criticized and called “soft” or “table” wines. The claim is that these are table grapes, only used for consumption in natura and not for winemaking.
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Most of the wines produced in America come from wine grapes, Vitis Vinifera. The origin of V. Vinifera has its roots in the ancient Caucasus (where Georgia, Armenia, Azerbaijan are) – wine was produced in this region 7,000 years ago or more – and include the most popular wine grape varieties: Cabernet Sauvignon, Pinot Noir, Chardonnay, etc. If you want to learn more about this, read: Georgia, the cradle of wine.
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Wine grapes have been thoroughly investigated. They are what you can call elegant and evil, think The Devil Wears Prada. These grapes are smaller, have hard seeds, their skins are thick and offer higher content of juice. In addition, they are sensitive, difficult to transport and when you bite a grape, it dissolves, leaving bitter, hardy seeds and a “chewing” ladle in the mouth.
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Their secret is a high sugar content that leaves hands and fingers sticky to the touch. Fermented sugar produces alcohol and many compounds responsible for the delicious aromas of a wine.
Wine grapes produce better wines and last for much longer after harvest. They have a greater variety of flavours, more delicate, richer, with a pleasant, acidic aroma. Rarely or never smelling unpleasantly like mould or a wet dog as many indigenous grape varieties do. To learn more about aromas, you can read our articles: You knew alcohol affects a lot, but do you realize how it changes the feel of your drink? And still Why wine has the aroma of pineapple, cinnamon or wood?
The little use of American Vitis in the production of wine is not due to the lack of raw material because the whole American continent was always covered with vines. So much so that in 985, a Viking named Bjarni Herjolfsson sighted America, after his ship was diverted from the course on the way from Iceland to Greenland. In 1001, Leif Ericsson, the son of Eric the Red, sailed west to find this new land. Leif and his men were the first known Europeans to land in America. They spent the winter in a place they called “Vinland” (Wineland), precisely because of the abundance of vines.
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Research on indigenous grapes native to America is not particularly developed. They are noticeably different from wine grapes in how and where they grow, what aromatic compounds they produce, and special winemaking techniques practised to produce more complex wines.  Unfortunately, for commercial reasons, there is little incentive to study them. Few of the hundreds of native varieties that have been identified in the last 200 years are grown.
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The diversity of exquisite and juicy table grapes.
Table grapes are graceful and juicy because they are grown to become desirable for natural consumption. Modern ones have no seeds, thicker flesh and thinner skin to make that delicious ‘pop’ when you eat them. For the rest, seedless grapes are obviously easier to eat but are less palatable than the old varieties of seeded table grapes.
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A colourful bunch of Niagara Grape.
Indigenous grape wine consumers complain of an unpleasant astringency in Vitis Vinifera wines, especially in monovarietals, and that others do not show a definite flavor quality.  Indigenous American grapes, on the other hand, are more refreshing and their unfermented juice makes a delicious drink, loaded with health valuable properties (resvetrarol) without the alcohol.
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The benefits of red wine are present in grape juice.
It is known American native grapes are less acid and less sugary than wine grapes. The standard indigenous grape presents a Brix level of 17-19, while the wine grape is closer to 24-26 Brix in the harvest. Brix is the scale used to measure the percentage of sugar in a liquid, essential in the fermentation process of wine grape juice.
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Refractometer measuring sugar level.
The pruning of native vines and grapes is equally important, as fewer grapes are equivalent to more concentrated flavours, to better wine. An overly vigorous vine will produce a heap of grapes of poor quality. A less vigorous vine will produce less concentrated grapes. A single native grapevine such as the Cowart Muscadine (Vitis rotundifolia) can produce 7 -14 kg. A Zinfandel (Vitis vinifera) produces around 4-6 kg of grapes per vine. That’s why table grape wine is much cheaper.
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Vitis vinifera well trimmed to concentrate aromas and flavours.
Agronomists try to hybridize the good side of Vitis Vinífera with the best of Vitis Americana, searching for strong, tasty and aromatic varieties such as Goethe, mentioned in I bet you never listened of this grape. However, despite the efforts of producers, few of these hybrids are of commercial value. As we saw, nature so far has done a better job. But everybody knows that, right?
Source:  The Domestication of American Grapes  by Professor U. P. HEDRICK e Table Grapes x Wine Grape

Por que vinho tem aroma de abacaxi, canela ou madeira? Alguém colocou tudo isto lá? Descubra aqui o segredo para esta pergunta que não quer calar.

Existem bem mais de 100 compostos aromáticos individuais no vinho que interagem uns com os outros para criar milhares de aromas potenciais. Ainda assim, apesar do que você possa ter ouvido, não importa se você é um super provador ou aquele tipo de cara que gira a taça e cheira em desespero sem sentir absolutamente nada, quase todo mundo pode melhorar o seu olfato, aprendendo a identificar diferentes aromas no vinho. Isso soa complicado, mas se resume simplesmente a praticar e prestar muita atenção – e é claro que anotar umas dicas do Master Sommelier Matt Stamp, não vai fazer mal para ninguém.

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Aroma pra caramba!

Se você já detectou aromas distintos no vinho, provavelmente você está a caminho de aprender a identificar diferentes classes de aromas. Por exemplo, você pode ter encontrado uma nota de pimentão verde, grama recém cortada ou até mesmo cheiro de gasolina. Por mais complexa que seja a ciência dos aromas, existem algumas classes  de compostos muito conhecidos, referidos como compostos de impacto, que são prevalentes em certos vinhos. Estes compostos de impacto são como indicadores muito relevantes, apontando para um varietal e não outro, o que significa que aprender a identificá-los pode desbloquear habilidades sobrenaturais de degustação tipo o Masters da vida. Da próxima vez que você provar um vinho, tente identificar o seguinte:

1.Pirazinas (metoxipirazina)
Aromas de pimentão, grama cortada fresca, pimentão verde, aspargos, ervilha e terra.
Vinhos: Cabernet Sauvignon, Merlot, Malbec, Carménère, Sauvignon Blanc e Cabernet Franc.
As pirazinas são mais associadas com variedades de Bordeaux. Em vinhos tintos, é muitas vezes um toque mais difícil de sentir e às vezes pode ser associada com aroma de chocolate amargo. A maioria dos enófilos adoram estes aromas nos seus brancos, mas o tomam com reserva nos tintos. Curiosamente, à medida que os vinhos tintos envelhecem, a pirazina modifica-se, revelando cereja e chocolate.
Existem 3 metoxipirazinas primárias que contribuem com aromas “vegetais”:
. 2-metoxi-3-isobutil-pirazina (IBMP) = aromas de pimentão, terra, grama e herbáceos;
. 2-metoxi-3-isopropilpirazina (IPMP) = aromas de aspargos, ervilhas e terra;
. 2-metoxi-3-alquilpirazina = aromas de noz e defumados.

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2. Monoterpeno
Aromas de rosas, flores, frutas doces, mexerica, coentro e especiarias doces.
Vinhos: Gewürztraminer, Viognier, Riesling, Albariño, Muscat Blanc e Torrontés.
Os monoterpenos mais pronunciados incluem os compostos de Linalol, Geraniol e Nerol. Estes são os mesmos compostos aromáticos utilizados para criar perfumes, sabonetes e xampus com aromas doces por isso não é nenhuma surpresa que algumas pessoas possam descrever estes vinhos como tendo um cheiro de sabonete. O que é interessante sobre estes aromas é que ao contrário dos outros compostos, você pode senti-los nas frutas, ou seja, eles independem da vinificação.

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3. Sotolona
Aromas de curry, xarope de bordo (o famoso maple syrup), feno-grego, nozes e melaço.
Vinhos: oxidados como Madeira, Vin Jaune, Jerez, Sauternes e alguns tintos ou Chardonnays bem antigos.
Este é o principal composto de sabor encontrado no feno-grego. No vinho, provém da oxidação e é mais prevalente em vinhos fortificados como o Jerez e o Madeira. Você também pode prová-lo se você envelhecer um vinho branco por cerca de 7 a 10 anos, este aroma é intrigante e fundamental para identificar vinhos antigos.

 

Maple Syrup: aproveite para provar fora do Brasil. Taí um aroma difícil para nós. Feno-grego é mais fácil de encontrar. Vire um rato de feiras, supermercados e floriculturas.

4. Rotundona
Aromas de pimenta preta, manjerona, couro, cacau em pó e ervas.
Vinhos: Syrah ou Shiraz, Grenache, Zinfandel, Petite Sirah, Grüner Veltliner e Mourvèdre.
Este composto é o ingrediente chave nas pimentas preta e branca e é cerca de 10.000 vezes menos prevalente no vinho. Ainda assim, a sensibilidade humana a este composto é muito elevada, por isso desempenha um papel importante nos perfis de sabor dos vinhos que o contêm.

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5. Compostos de Enxofre
Podem ser o segredo da super discutida origem da mineralidade no vinho.
Vinhos: Chablis e Champagne
Alguns compostos de enxofre têm notas fantásticas, como o aroma de giz num excelente Chablis. Outros são bem ruins, como cheiro de lã molhada,  considerado uma falha no vinho causada pela exposição à luz solar.

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6. TDN (1,1,6, -trimetil-1,2-di-hidronaftaleno)
Aromas de querosene, petróleo e diesel.
Vinhos: possivelmente em Sauvignon Blanc e Chardonnay, mas é mais perceptível (e amado) no Riesling.
Este aroma é um dos poucos compostos que quase inexistem em uvas ao natural e se desenvolvem nos vinhos à medida que envelhecem. Os vinhos com notas mais pronunciadas de gasolina vêm de vinhedos mais quentes porque este composto se desenvolve com uvas expostas à forte luz solar.

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7. Diacetil
Aromas de manteiga e creme de leite.
Vinhos que sofreram fermentação maloláctica.
Este composto é muito mais pronunciado em vinhos brancos, mas acrescenta um aspecto muitas vezes descrito como cremoso ou aveludado ao vinho tinto. O diacetil se origina no processo de pós-fermentação chamada fermentação maloláctica que envolve bactérias que consomem o ácido málico e o transformam em ácido láctico. O resultado é um vinho incrível com aroma e textura cremosos e amanteigados . Pouquíssimos vinhos brancos passam por este processo é esta uma das principais razões para que tenham um sabor muito diferente dos vinhos tintos.

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Creme e manteiga. Uma delícia fora e nos vinhos.

Além da maravilha que o vinho como ser vivo representa, através de sua riqueza de compostos, fermentação e envelhecimento, teoriza-se que a videira desenvolveu estes compostos de aroma como um avanço evolutivo para atrair insetos e animais para auxiliar na polinização e dispersão de sementes. Não vamos desapontá-las, não é mesmo?

Créditos fotos: internet.

Fonte: a sempre brilhante http://winefolly.com/tutorial/impact-compound-aromas/

Que o álcool afeta muita coisa você já sabia, mas sabe como ele altera o sabor da sua bebida? / You already knew that alcohol affects a lot of things, but do you know how it changes the taste of your drink?

Você já reparou que ao adicionar água ao uísque, que reduz sua porcentagem de álcool, se revelam novos e sutis sabores? Ou que uma taça de vinho tinto tem menos sabor frutado do que suco de uva sem álcool? 

Já que nosso assunto principal é vinho, comecemos por inalar profundamente o vinho que está na sua taça para compreender este processo. Você pode descrever os aromas que detecta? Frutas secas, frutas frescas, flores, grama, madeira e/ou especiarias? Esqueça os caríssimos kits atopetados de aromas artificiais tipo morango de xarope ou cereja de balinha. Ou vice-versa. Uma boa maneira de treinar seu cérebro e aumentar a sua memória olfativa é treinar em feiras, jardins, floricultura e lojinhas de temperos.

 

 

 

 

Esta lojinha de temperos pode ser um banquete de aromas.

Graças ao nosso sentido do olfato,  podemos detectar até 10.000 odores diferentes, embora não possamos identificar todos eles. Isto acontece por causa do “limite de detecção” que é a concentração mínima de um aroma que deve estar presente para que possamos percebê-lo. Agora, atenção que isto é importante:

  1. Os aromas, também chamados de cheiros, odores e fragrâncias, consistem em uma ou mais moléculas de aroma. Os aromas são voláteis e atingem o nosso olfato através do intervalo entre os mesmos, ou seja, o espaço aéreo diretamente acima da superfície do líquido que vai eventualmente terminar nas nossas narinas.

2. Nós percebemos os aromas através do nariz (oronasal), bem como através da boca (retronasal). Cada vez que engolimos, a língua detecta os sabores (esse é outro papo) e os aromas sobem através pela parte traseira de nossa garganta e pela passagem nasal. Isto explica porque degustamos vinho usando uma técnica um tanto bizarra – fazendo ruído para movimentar e sacudir e arejar o vinho (e portanto, os aromas). Desta forma, não há necessidade de engolir o álcool, mas pode-se detectar melhor as moléculas de aromas voláteis do vinho.

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3. Muitos fatores influenciam os odores que podemos detectar durante uma degustação, inclusive o mecanismo de deglutição e o cérebro, porém o importante aqui é que cada molécula de aroma se comporta de forma diferente em distintos solventes, dependendo de suas propriedades físicas. As moléculas de aroma hidrofóbicas são adversas à água. Elas tendem a fugir quando cercadas por moléculas de água, subindo para o tal intervalo, onde é mais fácil serem detectadas pelo nosso olfato.

4. Por outro lado, as moléculas de aroma hidrofílico têm afinidade com moléculas de água e preferem permanecer em líquidos. O álcool (etanol) tem propriedades parcialmente hidrofóbicas. Isto explica porque as moléculas hidrofóbicas dos aromas encontrados em bebidas alcoólicas ainda permanecem em seu vinho apesar da presença do álcool.

5. A proporção de líquidos – água x álcool – determina quais aromas são mais fáceis de detectar do que outros: quanto mais álcool houver em sua bebida, os aromas mais hidrofílicos escaparão para o intervalo. Por outro lado, quanto maior o volume de água, mais aromas hidrofóbicos você terá escapando do líquido e se movendo para o intervalo.

Aqui vemos o Prof. Pedro detectando aromas no tal intervalo.

Na sua próxima degustação você pode ter certeza que o prazer da riqueza de aromas percebidos é devido também a este equilíbrio muito delicado de água x álcool. Graças à presença dele, conseguimos apreciar os sabores sutis dos nossos vinhos e bebidas alcoólicas favoritas e especialmente harmonizá-los com a comida!

 

 

 

 

 

Deguste os mesmos pratos com um vinho branco ou rosé (normalmente menos alcoólico) e com um tinto (tradicionalmente mais alcoólico) e tire suas próprias conclusões.

Fonte: O álcool e os aromas no vinho de Bernard Lahousse


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Have you ever noticed that adding water to whiskey, which reduces alcohol percentage, reveals new and subtle flavours? Or that a glass of red wine has less fruity flavour than grape juice without any alcohol?

Since our main subject is wine, let us begin by inhaling deeply the wine which is in our glass to understand this process. Can you describe any aromas? Dried fruits, fresh fruits, flowers, grass, wood and/or spices? Forget about the expensive kits with artificial aromas of strawberry syrup or baloney cherry. A good way to train your brain and increase your olfactory memory is to train at fairs, gardens, flower and spice shops.

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This spice shop can be a feast of aromas.

Thanks to our sense of smell, we can detect up to 10,000 different odours, although we can not identify all of them. This is because of the “limit of detection” which is the minimum concentration of an aroma that must be present before we can perceive it. Now, note that this is important:

1. The aromas, also called scents, odours and fragrances, comprise one or more aroma molecules. The aromas are volatile and reach our nostrils through the gap between them. It is the airspace directly above the surface of the liquid that will eventually end up in our nostrils.

2. We perceive the aromas through our nose (oronasal) and through our mouth (retronasal). Each time we swallow, our tongue detects flavours (this is another different post) and the aromas rise through the back of our throat and through the nasal passage. This explains why we taste wine using a rather bizarre technique – making noise to move, shake and aerate wine (and therefore the aromas). In this way, there is no need to swallow alcohol, but one can better detect the molecules of volatile wine aromas.

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3. Many factors influence odours we can detect during a tasting, including the swallowing mechanism and the brain, but the important thing here is that each aroma molecule behaves differently in different solvents, depending on its physical properties. Hydrophobic aroma molecules are averse to water. They flee when surrounded by water molecules, rising to such an interval where it is easier to be detected by our sense of smell.

4. On the other hand, hydrophilic flavour molecules have an affinity with water molecules and prefer to remain in liquids. Alcohol (ethanol) has partially hydrophobic properties. This explains why the hydrophobic molecules of the aromas found in alcoholic beverages remain in wine despite the alcohol.
5. The ratio of liquids – water to alcohol – determines which scents are easier to detect than others: the more alcohol in your drink, the more hydrophilic aromas will escape into the range. The higher the volume of water, the more hydrophobic scents you will have escaping from the liquid and moving into the range.

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Here we see Prof. Pedro detecting scents in such a range.

In your next tasting, notice the pleasure of the richness of perceived aromas is also due to this delicate balance of water vs. alcohol. Thanks to their presence, we have been able to enjoy the subtle flavours of our favourite wines and spirits and especially harmonize them with food!

Try the same dishes with a white or a rosé wine (usually less alcoholic) and a red wine (traditionally more alcoholic) and draw your own conclusions.

Source: Alcohol and aromas in the wine of Bernard Lahousse

Grasse: vinhos, conquistas e perfumes. Aprendendo tudo isso com Napoleão.

Vamos encontrar nosso ilustre guia em um momento iluminado de sua vida. Em dezembro de 1804 o ambicioso Napoleão é coroado imperador aos 35 anos de idade. Após inúmeras campanhas militares e vitórias em batalhas importantes por todo o continente europeu, ele havia atingido o maior de seus objetivos.

Pintura retrato de Napoleão na perfumaria Galimard.
Pintura retrato de Napoleão na perfumaria Galimard.

No entanto, como dizem por aí, não há mal que nunca termine nem bem que dure para sempre, e em março de 1814, o imperador que já havia sido derrotado na Rússia em 1812 e na Alemanha em 1813, não pode impedir os russos e os austríacos de invadirem a França e se apoderarem de Paris.

Desesperado por uma ofensiva e por negociar com os aliados, Napoleão abdica no dia 11 de abril enquanto Luis XVIII vem recuperar a coroa da França. Mas tudo o que ele consegue é terminar isolado, com uma parte de sua tropa na Ilha de Elba cuja soberania lhe foi concedida.

No dia 26 de fevereiro de 1815, Napoleão escapa de seu exílio na Ilha de Elba onde ele viveu por mais de 10 meses. Separado da família e sabendo que muitos franceses estão insatisfeitos com Luis XVIII, ele tinha outra razão importante para esta reconquista: ele precisa dos 2 milhões de francos anuais que o rei prometeu lhe enviar para manter sua guarda e nunca mandou. É o começo da reconquista para o governo dos 100 dias.

Ás 5 da manhã do dia 1. de março, Napoleão desembarca na margem do Vallauris na enseada do golfo Juan, Cannes. Hoje a cidade é palco de badalação de estrelas da música e do cinema, passarela de magnatas das mais diversas nacionalidades cujas fortunas têm origem distintas, porém antigamente era um agitado porto de entrada para França, junto à vizinha Marselha, rota movimentada por comerciantes e piratas. Vai ver nem mudou tanto assim.

Vista de Cannes. Hoje palco de badalação de estrelas da música e do cinema, antigamente era um movimentado porto de entrada para França, junto com Marseille.
Vista de Cannes.

Após esperarem em vão pela ajuda da guarnição de Antibes, pois os 25 entusiasmados soldados que entraram gritando ‘Viva Napoleão’ na cidade, acabaram presos, tomados por loucos, a tropa partiu pelo “Grand Chemin des Alpes” rota difícil, mas direta que permitiria evitar os defensores do rei no vale do Rhône e viajar mais depressa que as notícias da volta do imperador. Nesta primeira noite, dormem nas areias brancas e limpas do que um dia será a Croisette.

Hoje a Croisette conta com alguns dos melhores hotéis do mundo como por exemplo o Ritz Carlton. Na época Napoleão dormiu na areia mesmo.
Hoje a Croisette conta com alguns dos melhores hotéis do mundo como por exemplo o Ritz-Carlton. Na época Napoleão dormiu na areia mesmo.

A escolha por dormir na areias de Croisette é simples. Chegando em silêncio, na calada da noite, a tropa preferiu se manter longe da cidade antiga de Cannes. O belo Suquet.

O relógio do Suquet marca a parte alta (a única, na verdade) de Cannes.
O relógio do Suquet marca a parte alta (a única, na verdade) de Cannes.
As ruelas estreitas da cidade antiga escondem história e contrastam com a badalação da Cannes "nova".
As ruelas estreitas da cidade antiga escondem história e contrastam com a badalação da Cannes “nova”.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

No dia 2 de março a tropa se levanta junto com o sol e se põe em marcha, chegando a Grasse ainda pela manhã.

As marcas da passagem de Napoleão estão por todo o lado.
As marcas da passagem de Napoleão estão por todo o lado.

A pequena e simpática cidade de Grasse é conhecida por sua tradição na produção de perfumes.

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Nos perfumes, assim como nos vinhos, os aromas se completam e se combinam para formar um todo que deve possuir equilíbrio para ser perfeito.

Quem já visitou a Provença pode testemunhar que a paixão francesa pelos aromas vai muito além das extensas plantações de lavanda. Isso vem desde Luís XIV, o rei Sol que preconizava uma França símbolo do luxo, do bom-gosto e da sofisticação.

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Um mascate perfumista com todos os seus apetrechos.

Fazer perfume é um pouco como fazer vinho, pois envolve os sentidos da visão e do olfato também. Os aromas se completam e se combinam formando um todo. Os perfumes mais complexos e equilibrados são os que normalmente agradam mais. As 2 artes também evocam sedução e paixão física através da excitação destes mesmos sentidos.

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Laboratório da Galimard.

Em Grasse, você vai encontrar 3 perfumarias muito legais que você pode visitar gratuitamente. A Moulinard, a Galimard e a Fragonard. Parece piada, mas os nomes são assim mesmo. A Galimard é bacana porque tem um museu que explica a fabricação dos perfumes passo a passo. A Moulinard é a mais simplezinha de todas, não tem muito para ver. Além disso topei fazer um curso de perfumista de 1 hora que na realidade era misturar 1 base com 3 aromas em 5 minutos. Por 30 euros, valor que paga alguns perfumes bem legais. Fuja desta! Há outras opções dos tais cursos, vale procurar e se informar bem para evitar desapontamentos. A Fragonard tem um museu muito completo e cheio de curiosidades sobre o mundo do perfume e a família. Vale a visita.

Aliás se você está mesmo louco para conhecer sobre perfumes, recomendo o Dênis Pagani. Ainda não tive oportunidade de fazer o curso dele aqui no Brasil, em São Paulo mesmo, mas é super recomendado.

A Galimard é bacana porque tem um museu que explica a fabricação dos perfumes passo a passo.
A Galimard é bacana porque tem um museu que explica a fabricação dos perfumes passo a passo.

 

 

 

 

 

 

 

 

A Moulinard é a mais simplezinha de todas. Além disso topei fazer um curso de perfumista de 1 hora que na realidade era misturar 1 base com 3 aromas em 5 minutos. Por 30 euros. Fuja desta!
A Moulinard é a mais simplezinha de todas. Não caia no conto do curso!

 

 

 

 

 

 

 

 

A Fragonard tem um museu muito completo e cheio de curiosidades sobre o mundo do perfume. Vale a visita.
A Fragonard tem um museu muito completo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Mas voltando à vida do nosso guia e sua peripécias, dia 7 de março, Napoleão chega a Grenoble. Lá o ‘aventureiro’ torna-se ‘príncipe’. É o fim de um período importante do retorno que parece ser triunfal. Este caminho percorrido ficou conhecido como a Rota de Napoleão.

A rota de Napoleão é bem sinalizada e vale a viagem.
A rota de Napoleão é bem sinalizada e vale a viagem.

De Grenoble, ele se dirige a Paris para 100 dias de poder que vão culminar na derrota final em Waterloo e em seu exílio, agora na Ilha de Santa Helena, até sua morte em 1821 aos 51 anos.

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A essência de Napoleão. Apesar da polêmica em torno de sua sangrenta ambição que trouxe tantas guerras à Europa, ainda muito admirado pelos franceses e por militares do mundo todo.
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A Galimard produz o perfume em homenagem a Napoleão que leva o ano do fim de seu império (1815) e não o de sua passagem pela cidade (1814).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Gostou da dica? Então quando estiver pela Provença, não inclua Cannes no seu roteiro pela badalação, mas por sua rica história.

Acompanhe nosso posts porque vamos dar mais dicas sobre visitas imperdíveis para você que vai à Provença.

Bibliografia: Route Napoleon – Guides Gallimard e Napoleão Uma Biografia Literária – Alexandre Dumas.